Jerusalém: a biografia 

Resenha de Livros

Jerusalém

a biografia

Simon Sebag Montefiore

Por: Reginaldo Cresencio®

Da cidade que fala de nós

Poucas cidades do mundo carregam tanta densidade histórica e espiritual quanto Jerusalém. Ler Jerusalém: A Biografia, de Simon Sebag Montefiore, é como caminhar por ruas estreitas onde o pó ainda guarda as marcas dos pés de reis, profetas, guerreiros, peregrinos e multidões anônimas que ali buscaram sentido, fé ou poder; ele percorre a longa e turbulenta história da cidade que, mais do que qualquer outra, moldou a fé, a política e a cultura da humanidade. Montefiore não escreve apenas uma narrativa histórica; ele oferece uma verdadeira crônica viva, em que reis, sacerdotes, guerreiros, profetas, cruzados, rabinos, sultões e políticos desfilam pelas páginas, revelando como Jerusalém se tornou símbolo eterno de esperança e conflito.

O livro é uma narrativa monumental, mas também um espelho: ao contar a história da cidade, Montefiore revela algo profundo sobre a própria humanidade — sua sede de transcendência, sua inclinação à idolatria e sua busca incessante por domínio.

Jerusalém é apresentada como palco da glória de Deus e do pecado dos homens. Ali, Davi ergueu o estandarte da adoração, mas também ali o povo caiu em idolatria. Salomão construiu o Templo para o Senhor, mas entregou-se a deuses estrangeiros. Os romanos destruíram a cidade em 70 d.C., e os cruzados, séculos depois, tingiram suas pedras com sangue em nome de uma fé que, muitas vezes, mais se parecia com ambição do que com devoção. Montefiore registra cada detalhe como quem abre uma crônica de contrastes: santidade e violência, lágrimas e triunfo, promessa e ruína.

Ao longo da leitura, percebi que Jerusalém não é apenas geografia — é teologia encarnada na história. É a arena em que se travam as grandes batalhas entre o Céu e a terra, entre a verdade e a mentira, entre a esperança e o desespero. A cidade santa tornou-se também cidade sangrenta, revelando o quanto o coração humano pode distorcer até mesmo o que Deus consagra.

E não é isso que vemos ainda hoje? A modernidade construiu suas próprias Jerusaléns: lugares de disputa, símbolos de poder, palcos de vaidades. As redes sociais são uma espécie de "muro das lamentações digital", onde multidões despejam sua dor, mas também erguem ídolos de si mesmas. O mercado de consumo é a nova "Feira das Vaidades", oferecendo tudo, menos o que realmente sacia. A política global frequentemente se assemelha às sucessivas invasões de Jerusalém: grupos que reivindicam autoridade sobre algo que, no fundo, pertence somente a Deus.

Montefiore não escreve com tom devocional, mas sua narrativa nos conduz inevitavelmente a uma reflexão espiritual. Jerusalém, a cidade terrestre, nunca trouxe a paz que promete. Ela foi e continua sendo disputada porque o homem tenta construir no tempo o que só se cumprirá na eternidade. As lágrimas nas páginas da história da cidade ecoam a verdade bíblica: "Não temos aqui cidade permanente, mas buscamos a que há de vir" (Hb 13.14).

Ao final, o livro nos faz ansiar pela Nova Jerusalém descrita em Apocalipse 21. Diferente da cidade marcada por muros derrubados e reconstruídos, aquela não será obra de homens, mas descida do céu. Não terá templo, porque o próprio Cordeiro será o templo. Não haverá guerras, porque o Príncipe da Paz reinará para sempre. Não haverá pranto, porque Deus enxugará dos olhos toda lágrima.

Montefiore escreveu a biografia de uma cidade, mas, em certo sentido, escreveu também a biografia da humanidade: uma história de glórias e quedas, de conquistas e fracassos, de fé e desvio. Como pastor, leio este livro como um alerta e uma esperança. Alerta, porque os homens continuam buscando em pedras e tronos aquilo que só se encontra em Cristo. Esperança, porque o Deus que preservou Jerusalém através de séculos de fogo e espada é o mesmo que garante nossa chegada à Cidade Celestial.

Jerusalém: A Biografia é leitura indispensável para quem deseja compreender não apenas a história de uma cidade, mas a alma do homem. Mas, acima de tudo, é um lembrete de que somente quando os olhos se voltarem para o Cordeiro é que Jerusalém — e nós — conheceremos a paz definitiva.

_______________________________________________________

OPINIÃO SINCERA: Nota 9,0

_______________________________________________________

Montefiore, Simon Sebag. Jerusalém: a biografia – São Paulo, SP – Companhia das Letras, 2013.

Livro – Casa E-3D