A Religião que não salva

Por: Pr. Reginaldo Cresencio,
Pregado no domingo à noite, 30 de novembro de 2025,
na Igreja Batista Raízes, São Carlos - SP.
Texto Base: Romanos 2.17-29
Introdução
Quando a Religião se Torna um Refúgio Perigoso
Após confrontar os gentios que caíram na idolatria (1.18–32) e os moralistas que se justificavam pela aparência de bondade (2.1–16), Paulo agora mira o grupo mais religioso e confiante de todos, os judeus.
Eles tinham a lei, tinham os profetas, tinham a circuncisão, o templo, a história, a tradição e acreditavam profundamente que isso os colocava em posição de privilégio espiritual, mas Paulo faz aqui uma das denúncias mais duras de toda a Epístola:
"Vocês têm a religião, mas não têm Deus."
Este texto é um espelho para toda igreja, porque o perigo dos judeus é o mesmo perigo do cristão moderno:
- confiar nos símbolos, não na realidade;
- confiar na tradição, não na transformação;
- confiar na doutrina, não no arrependimento;
- confiar na membresia, não no novo nascimento.
Paulo desmonta toda autossuficiência religiosa e mostra que a religião pode se tornar um manto para esconder um coração não regenerado.
Ao preparar esse sermão pedi ao Senhor que vocês o recebam não com defensiva, mas com a mesma oração que eu mesmo fiz ao ler esse texto bíblico:
"Senhor, não permitas que minha fé seja apenas externa; dá-me um coração realmente circuncidado."
1. O Orgulho da Religião (vs. 17–20)
Paulo começa descrevendo as sete fontes de confiança do judeu:
"Tu tens o nome de judeu"
"Repousas na lei"
"Te glorias em Deus"
"Conheces à vontade"
"Discernes o melhor"
"És guia dos cegos"
"És luz dos que estão em trevas"
Tudo isso era verdade, mas era insuficiente.
Eles tinham o título, mas não o coração.
Tinham o símbolo, mas não a essência.
Tinham a lei, mas não a obediência.
Tinham doutrina, mas não transformação.
É possível ter uma teologia perfeita e um coração morto.
É possível ser mestre dos outros sem ser discípulo de Cristo.
É possível conhecer a vontade de Deus e ainda assim resistir a ela.
A igreja evangélica contemporânea corre o mesmo risco:
- ter Bíblia, mas não ter submissão;
- ter culto, mas não ter quebrantamento;
- ter ministérios, mas não ter santidade;
- ter tradição, mas não ter transformação.
A pergunta não é: "Você conhece a doutrina?"
A pergunta é: "A doutrina mudou sua vida?"
2. A Incoerência da Religião Exterior (vs. 21–24)
Paulo agora expõe a contradição:
"Tu, pois, que ensinas a outro, não te ensinas a ti mesmo?" (v. 21)
"Tu que pregas que não se deve furtar, furtas?"
"Dizes que não se deve adulterar, adulteras?"
"Abominas ídolos, mas roubas templos?"
"Tu que te glorias na lei, desonras a Deus pela transgressão da lei?"
Em outras palavras:
"Vocês pregam lindamente, mas vivem vergonhosamente."
Os judeus tinham orgulho de serem o povo da aliança…, mas suas vidas contradiziam o Deus da aliança.
E então Paulo traz a sentença devastadora:
"Por causa de vocês, o nome de Deus é blasfemado entre os gentios." (v. 24)
Ou seja, o mal testemunho dos "religiosos" fazia o mundo rejeitar o próprio Deus.
Há duas formas de desonrar a Deus:
- pecando descaradamente;
- e professando Sua verdade sem viver Sua verdade.
Essa palavra é para nós, cristãos.
Quantas vezes:
- nossas palavras não combinam com nossos gestos?
- nossa família conhece um "outro eu" dentro de casa?
- o mundo zomba do Evangelho por causa da nossa incoerência?
A hipocrisia é o maior escândalo do cristianismo. Não é nossa doutrina que afasta as pessoas, é nossa duplicidade. Deus não pede perfeição absoluta, mas integridade, sinceridade e arrependimento verdadeiro.
3. A Religião sem Obediência Não Tem Valor (vs. 25–27)
A circuncisão era o maior símbolo da identidade judaica, era o selo da aliança, o sinal de pertencimento ao povo de Deus.
Mas Paulo afirma algo chocante:
"A circuncisão é proveitosa se guardares a lei; mas se és transgressor da lei, tua circuncisão se torna incircuncisão." (v. 25)
Ou seja:
A religião externa só tem valor quando acompanhada de vida transformada.
E vai além:
"Se o incircunciso guarda os preceitos da lei, não será a incircuncisão dele reputada como circuncisão?" (v. 26)
"E aquele que fisicamente é incircunciso, mas cumpre a lei, te julgará a ti..." (v. 27)
Paulo vira o mundo deles de cabeça para baixo:
- o incircunciso obediente é mais judeu do que o circuncidado desobediente;
- o gentil piedoso é mais próximo de Deus do que o judeu arrogante;
- a marca no corpo não substitui a marca no coração.
Hoje, não temos circuncisão como sinal religioso.
Temos outros:
- batismo
- membresia
- ministério
- cargos
- títulos
- tradição evangélica
Mas nada disso tem valor se não houver:
- arrependimento
- santidade
- fé viva
- obediência
- amor por Cristo
Símbolos não salvam. Doutrina sem vida é morte. Religião sem regeneração é ilusão.
4. O Verdadeiro Judeu é o Circuncidado no Coração (vv. 28–29)
Aqui está o clímax:
"Porque não é judeu quem o é apenas exteriormente..." "... mas judeu é o que o é interiormente."
"E circuncisão é a do coração, no espírito, não segundo a letra." (Vs. 28–29)
Paulo afirma com autoridade divina:
A verdadeira religião é interior, espiritual, regeneradora.
A circuncisão verdadeira é:
- do coração,
- feita pelo Espírito,
- fruto da graça,
- e se manifesta em obediência.
E então Paulo conclui:
"O louvor desse não procede dos homens, mas de Deus." (v. 29)
Em outras palavras:
O verdadeiro cristão não vive para aplausos humanos, mas para o aplauso de Deus.
Pergunte-se:
- Minha fé é externa ou interna?
- Meu cristianismo é cultural ou espiritual?
- Minha piedade é performance ou realidade?
- Busco o aplauso dos homens ou o sorriso de Deus?
A marca do cristão não é um rito, mas um coração novo. Não é um símbolo, mas uma vida transformada. Não é uma tradição, mas um novo nascimento.
Conclusão
Deus Não Procura Religiosos; Procura Redimidos
Romanos 2.17–28 nos chama a abandonar toda segurança falsa.
Ele nos leva a confessar que:
- não basta ter Bíblia — é preciso obedecer a Bíblia;
- não basta ter teologia — é preciso ter transformação;
- não basta ter a circuncisão externa — é preciso ter um coração circuncidado pelo Espírito;
- não basta ser evangélico — é preciso ser regenerado.
O Evangelho não é maquiar a vida, é morrer e nascer de novo. O verdadeiro cristão é aquele que o Espírito circuncidou com arrependimento, fé viva e amor por Cristo.
Diante disso, a pergunta final é:
Você é um cristão externo ou interno?
Sua vida é circuncidada pela letra ou pelo Espírito?
Você vive para o aplauso dos homens ou para o louvor de Deus?
A graça nos chama, não a uma religião de superfície, mas a um coração verdadeiramente transformado.
Mas eu ainda tenho uma boa notícia para te dar nesta noite
A boa notícia é esta:
- Deus não exige que você se transforme sozinho.
- Ele mesmo faz a obra dentro de você.
- A circuncisão do coração é obra do Espírito Santo, não do homem.
Isso significa que:
- não importa o quanto você já falhou na caminhada;
- não importa se sua fé tem sido fraca;
- não importa se você se identifica com a hipocrisia que Paulo denuncia;
O Senhor nunca rejeita um coração sincero que deseja mudança.
Se você anseia por um cristianismo autêntico…
se deseja ser um discípulo de verdade…
se quer uma vida que agrade a Deus em secreto e em público…
Então há esperança, o Espírito Santo está disposto a realizar essa obra em você.
Você não precisa viver uma fé de fachada.
Não precisa viver pelo costume.
Não precisa se esconder atrás de símbolos ou aparências.
Em Cristo, você pode experimentar:
- um coração renovado,
- uma fé viva,
- uma adoração verdadeira,
- uma obediência prazerosa,
- um caráter moldado pela graça.
E o mais extraordinário:
Deus te vê não pelo que você foi, mas pelo que Ele está te fazendo ser.
A circuncisão do coração é uma promessa da nova aliança.
É Deus dizendo:
"Eu mesmo te transformarei, e te darei um novo coração."
(cf. Ez 36.26–27)
Portanto, se existe arrependimento genuíno nesta noite, anime-se, irmão.
A obra que Ele começou, Ele mesmo há de completar.
Viva com confiança, com alegria e com esperança, o Deus que exige um coração novo é o Deus que dá um coração novo.
Oração Pastoral
Senhor nosso Deus, purifica-nos de toda religião vazia, de toda hipocrisia sutil, de toda aparência sem essência.
Circuncida o nosso coração pelo Teu Espírito.
Que a Tua Palavra não seja apenas conhecida por nós, mas vivida e obedecida.
Livra-nos do orgulho espiritual e dá-nos um
arrependimento profundo,
uma fé viva e um amor sincero por Cristo.
Que sejamos Teus, não apenas no nome, mas na verdade.
Em nome de Jesus, Amém.
Bibliografia
Bíblia de Estudo de Genebra. Tradução: Almeida Revista e Atualizada. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 2011.
BEEKE, J. R. (2022). Teologia Sistemática Reformada: Deus, Criação e Providência.São José dos Campos: Editora Fiel.
Calvino, J. (2013). Romanos. São José dos Campos - SP: Editora Fiel.
EDWARDS, J. (2018). A Liberdade da Vontade. São Paulo: PES.
Hendriksen, W. (2011). Romanos. São Paulo: Editora Cultura Cristã.
Lloyd-Jones, D. M. (2021). Romanos 1 - Evangelho de Deus. São Paulo: PES.
Sagrada, B. (2003). Bíblia de Estudo NVI. São Paulo: Editora Vida Nova.
