Não justo, nem um sequer

Por: Pr. Reginaldo Cresencio
Pregado no domingo à noite, 07 de dezembro de 2025,
na Igreja Batista Raízes, São Carlos - SP.
Texto Base: Romanos 3.1-20
INTRODUÇÃO
O momento em que toda boca se cala
Romanos 3.1–20 é a culminação do tribunal que Paulo vem construindo desde o capítulo 1.
- Primeiro, Deus mostrou a culpa dos pagãos (1.18–32).
- Depois, a culpa dos moralistas (2.1–16).
- Então, a culpa dos religiosos, dos que confiam em símbolos externos (2.17–29).
Agora, finalmente, Deus declara o veredicto universal:
"Todos pecaram. Ninguém é inocente. Ninguém é bom. Toda boca deve se calar."
Romanos 3.1–20 não nos deixa nenhum lugar para fuga. É o diagnóstico definitivo que revela a verdadeira condição humana:
* não somos doentes espirituais; somos mortos;
* não somos feridos; somos culpados;
* não somos ignorantes; somos rebeldes;
* não somos neutros; estamos debaixo da ira;
* não somos buscadores; somos fugitivos de Deus.
E por que Paulo precisa ser tão duro?
Porque ninguém busca o Médico até reconhecer que está mortalmente enfermo.
Antes que Paulo anuncie o evangelho da justiça de Deus, ele nos convence da injustiça profunda do homem.
Se quisermos realmente entender a graça, precisamos primeiro descer ao vale escuro do diagnóstico:
"Não há justo, nem um sequer."
I. OS PRIVILÉGIOS ESPIRITUAIS NÃO ANULAM A CULPA
(vv. 1–8)
Paulo antecipa a objeção judaica:
"Se somos o povo escolhido, qual é a vantagem de ser judeu?"
Ele responde:
Grande, em todos os sentidos; porque vocês receberam os oráculos de Deus. (v. 2)
Os judeus tinham privilégios reais:
* a lei,
* os profetas,
* a aliança,
* o culto,
* a revelação escrita.
Mas aqui está a verdade que destrói todo orgulho espiritual:
- Privilégio espiritual não salva ninguém.
- A responsabilidade aumenta proporcionalmente ao privilégio.
O judeu dizia:
* "Nós temos a lei."
* "Somos circuncidados."
* "Somos descendentes de Abraão."
Paulo responde:
"Vocês têm a lei, mas não obedecem a lei."
Judeus:
"E se alguns não creram?"
Paulo responde:
"Seja Deus verdadeiro e todo homem mentiroso." (v. 4)
A incredulidade humana não anula a fidelidade divina.
Judeus:
"Se o nosso pecado glorifica a Deus, por que Ele nos julga?"
Paulo responde:
"De outra maneira, como julgará Deus o mundo?" (v. 6)
Se esse argumento fosse válido, ninguém seria culpado, pois até o pecado faria "bem".
Judeus:
"Façamos o mal para que venha o bem."
Paulo corta pela raiz:
"A condenação desses é justa." (v. 8)
Muitos evangélicos modernos usam versões suavizadas dessas mesmas desculpas:
* "Fui criado na igreja, isso me garante algo."
* "Eu conheço a doutrina certa, isso me protege."
* "Deus entende minhas fraquezas, Ele não vai me julgar."
* "Ninguém é perfeito, Deus não é tão rigoroso assim."
Paulo diria a esses crentes culturais:
"Deus não faz acepção. Nenhum privilégio espiritual anula a necessidade de arrependimento."
II. A CONDENAÇÃO UNIVERSAL:
TODOS ESTÃO DEBAIXO DO PECADO (vv. 9–12)
"Todos, judeus e gregos, estão debaixo do pecado." (v. 9)
Paulo não diz que todos pecam, mas que todos estão debaixo do pecado.
Não é apenas comportamento, é posição legal.
É como alguém preso sob um peso que nunca consegue erguer.
O pecado é tirano cruel, juiz implacável e uma prisão de segurança máxima.
Então Paulo apresenta a lista mais devastadora sobre a humanidade em toda a Bíblia:
"Não há justo, nem um sequer."
- Não há uma única pessoa moralmente reta.
- Não existe "gente boa" no sentido espiritual.
- A bondade civil não é bondade diante de Deus.
"Não há quem entenda."
O homem natural não entende Deus, não entende o pecado, não entende a santidade.
"Não há quem busque a Deus."
Essa afirmação destrói todo arminianismo, pois o homem natural busca alívio, busca milagres, busca paz, busca sentido, buca fugir do inferno, mas não busca Deus.
A busca genuína começa quando Deus nos chama.
"Todos se extraviaram."
Não alguns, todos.
A humanidade inteira tomou o caminho errado, afastando-se da glória de Deus.
"Não há quem faça o bem, não há nem um sequer."
Paulo não fala de boas obras sociais, fala de atos verdadeiramente santos, feitos PARA Deus e POR amor a Deus.
Quantas vezes ouvimos:
* "Fulano é um homem bom."
* "Meu vizinho é bom, só não é crente."
* "Deus conhece meu coração."
* "Lá no fundo, todos têm bondade."
Paulo diz exatamente o contrário:
No coração humano não há bondade espiritual alguma.
É por isso que a graça não é uma ajuda, é um milagre.
III. A DEPRAVAÇÃO TOTAL EM AÇÕES, PALAVRAS E CORAÇÃO (vv. 13–18)
Aqui Paulo abre o "prontuário espiritual" da humanidade, citando vários trechos do Antigo Testamento.
1. A garganta, sepulcro aberto (v. 13)
"A garganta deles é sepulcro aberto."
A ideia é de morte exposta, odor horrível, corrupção pública.
A fala humana revela a podridão interna.
2. A língua, instrumento de engano
"Com a língua enganam."
Palavras manipuladoras, falsas, sedutoras —
A mentira é natural ao coração caído.
3. Os lábios, veneno de cobra
"Veneno de víboras está debaixo dos seus lábios."
A fala pode ferir, destruir, matar reputações, matar esperanças.
4. A boca; cheia de maldição e amargura (v. 14)
O que enche a boca revela o que enche o coração.
5. Os pés; rápidos para derramar sangue (vv. 15–16)
O movimento humano natural é destrutivo:
violência, destruição, miséria.
6. O caminho; desconhece a paz (v. 17)
O mundo fala de paz, mas não conhece o Caminho da paz que é Cristo.
7. Os olhos; sem temor de Deus (v. 18)
Este é o fundamento de toda depravação:
Quando o temor de Deus desaparece, todo pecado se torna possível.
Se você quer avaliar sua vida espiritual, pergunte-se:
* O que minhas palavras revelam?
* Meus caminhos produzem paz ou destruição?
* Meus olhos temem a Deus ou desprezam Sua santidade?
* Minha vida manifesta arrependimento ou autopreservação?
Não há salvação enquanto acharmos que "estamos bem".
Não há cura até admitirmos a doença.
IV. O VEREDITO FINAL:
TODA BOCA SE CALE (vv. 19–20)
"...para que toda boca se cale, e todo o mundo seja culpável diante de Deus."
No tribunal de Deus:
* não há argumentos,
* não há desculpas,
* não há justificativas,
* não há comparação com os outros.
O mundo inteiro é encontrado culpado.
E Paulo conclui:
"Porque ninguém será justificado diante de Deus por obras da lei."
"Pela lei vem o pleno conhecimento do pecado." (v. 20)
A lei:
* não salva;
* não transforma;
* não produz vida;
* não gera justiça.
A lei é o espelho; não a água.
A lei mostra a sujeira; não remove a sujeira.
A lei acusa; Cristo salva.
A lei fecha a porta da justiça humana para abrir a porta da justiça divina.
Aplicações
Pare de tentar se salvar.
Pare de argumentar com Deus.
Pare de comparar sua vida com a de outros.
Pare de suavizar seu pecado.
Reconheça que você não tem justiça, mas Deus tem e a oferece em Cristo.
Quando o homem cala, Deus fala; quando a justiça humana cai, a justiça de Cristo se levanta.
O Evangelho não é para pessoas boas; é para pessoas culpadas.
CONCLUSÃO
O SILÊNCIO QUE PRECEDE A GRAÇA
Romanos 3.1–20 é a mais profunda humilhação da alma humana. Mas é a humilhação que prepara o coração para a salvação.
Porque quando finalmente admitimos:
* "Eu não sou justo";
* "Eu não busco a Deus";
* "Eu não faço o bem";
* "Eu não posso cumprir a lei";
* "Eu não tenho defesa"
Então finalmente podemos ouvir:
"Mas agora se manifestou a justiça de Deus..." (3.21)
A lei cala a boca do homem para justiça própria.
O Evangelho abre a boca do homem para louvar Aquele que justo e Salvador.
A acusação é universal, mas a graça será oferecida gratuitamente, em Cristo.
ORAÇÃO PASTORAL
Senhor, cala hoje toda voz de orgulho em nós.
Revela-nos nossa verdadeira condição, não para nos destruir, mas para nos salvar.
Ensina-nos a parar de confiar em nós mesmos e a depositar toda nossa esperança na justiça perfeita do Teu Filho Jesus.
Que cada coração aqui reconheça sua culpa, e que ninguém saia daqui defendendo-se, mas todos saiam abraçados pela graça. Em nome de Cristo, Amém.
Bibliografia
Bíblia de Estudo de Genebra. Tradução: Almeida Revista e Atualizada. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 2011.
BEEKE, J. R. (2022). Teologia Sistemática Reformada: Deus, Criação e Providência.São José dos Campos: Editora Fiel.
Calvino, J. (2013). Romanos. São José dos Campos - SP: Editora Fiel.
EDWARDS, J. (2018). A Liberdade da Vontade. São Paulo: PES.
Hendriksen, W. (2011). Romanos. São Paulo: Editora Cultura Cristã.
Lloyd-Jones, D. M. (2021). Romanos 1 - Evangelho de Deus. São Paulo: PES.
Sagrada, B. (2003). Bíblia de Estudo NVI. São Paulo: Editora Vida Nova.
