OPINIÃO SINCERA

Resenha de Livros

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O Pregador e o Peregrino

A jornada de Spurgeon no clássico de Bunyan

Charles H. Spurgeon

Por: Reginaldo Cresencio


Alguns livros atravessam gerações como rios que nunca secam. O Peregrino, de John Bunyan, é um desses. Nascido em cárcere, regado por lágrimas e moldado pelo sofrimento, tornou-se um dos mais belos mapas espirituais já desenhados para guiar cristãos rumo à Cidade Celestial. Agora, na obra O Pregador e o Peregrino, temos a oportunidade de ver esse clássico pelas lentes de outro gigante: Charles Haddon Spurgeon. 

O que se encontra neste livro não é mera análise literária, mas o encontro de duas almas ardentes pelo mesmo Senhor. Bunyan, o peregrino aprisionado, e Spurgeon, o príncipe dos pregadores, caminham lado a lado, mostrando-nos que a vida cristã é, ao mesmo tempo, estrada e púlpito, caminhada e proclamação.

Spurgeon lê Bunyan não como um crítico distante, mas como um companheiro de viagem. Ele enxerga no "Cristão" de Bunyan a biografia espiritual de todo crente. Em cada batalha contra Apoliom, em cada descida ao Pântano do Desânimo, em cada fuga da Cidade da Destruição, Spurgeon encontra ecos da própria luta da Igreja em sua geração.

Ao refletir sobre a obra, percebo o quanto o Pregador e o Peregrino fala ao nosso tempo. Vivemos em uma era em que muitos desejam chegar à Cidade Celestial sem passar pela Estrada Estreita. Querem a coroa sem a cruz, a glória sem a peregrinação. Mas Spurgeon nos recorda que a jornada é inegociável. Cada passo do peregrino é um sermão pregado à própria consciência, e cada tropeço é uma ilustração da graça que sustenta.

Uma das riquezas deste livro é como Spurgeon transforma cada símbolo de Bunyan em aplicação prática. Ele lê a "Feira das Vaidades" e logo a conecta com os espetáculos vazios de seu tempo — que não diferem muito dos nossos. Hoje, a feira não está apenas nas praças; ela cabe no bolso, brilha em telas, e oferece produtos que não custam moedas, mas custam a alma. Quantos cristãos têm perdido sua peregrinação porque gastaram a vida em bancas coloridas da feira digital!

Ao falar sobre o "Fiel" e o "Esperançoso", Spurgeon nos faz lembrar que a caminhada cristã não é solitária. Na era da hiperconexão, onde muitos vivem cercados de "amigos virtuais", mas ainda assim carregam solidão real, a mensagem é clara: precisamos de companheiros de estrada. Não é o isolamento que nos fortalece, mas a comunhão dos santos, o ombro a ombro no caminho da fé.

Spurgeon também entende a dureza do Vale da Sombra da Morte. Ele próprio, marcado por crises de depressão e enfermidades, sabia que não se trata de metáfora poética, mas de realidade existencial. O pregador vitoriano encontra em Bunyan não apenas literatura, mas medicina para a alma. Ao expor o peregrino que anda em trevas, mas não perde de vista a luz distante, Spurgeon consola a Igreja de ontem e de hoje: ainda que a estrada seja escura, o Guia é fiel, e sua presença é suficiente para não nos perdermos.

O grande mérito desta obra é nos lembrar que a pregação não pode ser dissociada da peregrinação. O púlpito não é palco, mas ponto de descanso na estrada. O sermão não é discurso, mas pão para o viajante. Spurgeon, ao comentar Bunyan, mostra que cada pregador deve ser, antes de tudo, peregrino. Só assim sua voz terá o peso da verdade experimentada, e não apenas repetida.

No fim, O Pregador e o Peregrino nos conduz ao mesmo destino do clássico de Bunyan: a visão da Cidade Celestial. Spurgeon nos faz levantar os olhos, cansados das distrações da modernidade, e contemplar o brilho da pátria eterna. É como se dissesse: "O caminho é duro, mas a chegada é certa. E a chegada vale cada lágrima, cada tropeço, cada luta contra Apoliom".

Este livro é um presente duplo: nos dá Bunyan e nos dá Spurgeon, unidos em um mesmo coro, apontando para Cristo. Lê-lo é como ouvir dois pastores fiéis, de séculos diferentes, pregando em uníssono a mesma mensagem: não desista, caminhe, persevere, porque a Cidade Celestial está logo adiante.

Mais do que literatura devocional, é alimento para a alma e espada para a batalha. É lembrete de que, em tempos de fé superficial e de cristianismo de conveniência, a estrada ainda é estreita, mas gloriosamente conduz à presença do Rei.

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OPINIÃO SINCERA: Nota 9,5

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Spurgeon, Charles H. O Pregador e o Peregrino: A jornada de Spurgeon no clássico de Bunyan– Rio de Janeiro, RJ – Pro Nobis, 2024.

Livro – Casa E-5C